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Herança não enterrada da escravidão pode condicionar o futuro do Brasil

DEBATEDORES | Laurentino Gomes

A leitura da identidade brasileira por José Bonifácio de Andrada e Silva, apesar de ter mais de 200 anos, ainda é válida para o Brasil do século 21. “Ele dizia que é muito difícil se construir um país com realidades regionais, geográficas, étnicas, culturais [tão distintas], com tanta escravidão, tanto analfabetismo, tanta concentração de riqueza e tanto isolamento. Eu acredito que esse diagnóstico continua atual à nossa equação social”, salienta Laurentino Gomes, jornalista e escritor brasileiro.

O Brasil tem uma herança escravista, com uma elite que não apenas usufrui dos benefícios, mas também se apropria das políticas de Estado em benefício próprio, além de achar que tem a missão de salvar a decomposição geral — mas falha em não aceitar, em momento algum, a ideia de abrir mão dos privilégios”, argumenta.

Em entrevista ao Canal UM BRASIL — uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) —, o escritor enfatiza que outro diagnóstico centenário dizia ser lamentável que a “sepultura da escravidão” não seja larga o suficiente para abrigar, também, a sua herança. “Este é o nosso problema: a herança ficou de fora, é como um ‘zumbi’. E nós somos assombrados por esse fantasma.”

Na conversa, Gomes ainda conta que, em peregrinação pelo País, constatou que a herança da escravidão também está muito presente na paisagem e na geografia. “Existe uma parcela da população que tem todas as oportunidades, os privilégios e as prerrogativas no Brasil do século 21, que moram em condomínios que parecem castelos medievais, absolutamente protegidos por segurança e cercas elétricas, às vezes até invadindo áreas que seriam destinadas a reservas ecológicas. E, fora daquele espaço, o contexto é outro, é mais perigoso. Há um clima de tensão absolutamente visível. É um país tenso, como na época da escravidão, que só não explode por uma questão milagrosa”, destaca.

Segundo o jornalista, o País também carrega as marcas do imenso analfabetismo dos períodos coloniais e da Proclamação da República, em torno de 90% a 99% da população brasileira à época. “Esse é o Brasil que nós plantamos no passado e que explica o do presente — e que terá continuidade no futuro. Há uma quantidade absurda de passivos que acumulamos que não foram resolvidos no passado (por falta de vontade política ou pela conjuntura do momento) e nos desafiam e impedem a caminhada em direção ao futuro da maneira que gostaríamos, os quais podem condicionar o nosso futuro”, conclui.

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