A dificuldade de o Brasil avançar no processo de modernização tributária é um fator fundamental para se entender a complexidade que envolve empreender em um ambiente de negócios preso a uma baixa competitividade internacional. Por um lado, as empresas gastam muitas horas anualmente para honrar com as obrigações acessórias; por outro, a busca, há décadas, por um sistema “ótimo” impede que o País sequer alcance um modelo que não represente um entrave econômico – o que seria possível com medidas infraconstitucionais de simplificação tributária.
Estas são as reflexões surgidas no debate promovido pelo Canal UM BRASIL – uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) –, em parceria com o Centro Mackenzie de Liberdade Econômica. O encontro reuniu Vladimir Maciel, coordenador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica, e Rogerio Caiuby, conselheiro-executivo do Movimento Brasil Competitivo (MBC).
No bate-papo, Caiuby comentou um estudo feito há cerca de quatro anos pelo MBC com o Ministério da Economia que tinha o objetivo de entender o Custo Brasil – despesas que estão da “porta para fora” das empresas e que dificultam o ambiente de negócios. O executivo pondera que, em comparação às condições vigentes nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o setor produtivo brasileiro gasta R$ 1,5 trilhão a mais para fazer negócios. “Isso representa 20% do PIB [Produto Interno Bruto] ao ano, desperdiçados graças à complexidade imposta ao ambiente produtivo do País. O setor gasta, em média, 1,5 mil a 1,6 mil horas ao ano para honrar todos os tributos. Em comparação, os países da OCDE gastam 160 horas ao ano. Este é o ‘Custo Brasil’, de forma tangível. Os recursos, que estão sendo gastos em enormes estruturas nas empresas, poderiam ser convertidos em menores preços e mais empregos”, afirmou Caiuby.
Maciel, por sua vez, destacou que a solução para o entrave é ir além da simples discussão da redução da carga tributária, que também é um fator importante, mas que, tratado isoladamente no debate público, impede um avanço concreto das reformas. “O fator ‘carga’ é muito importante, mas se ficarmos somente neste aspecto, a discussão ‘empaca’. Nós já estamos há mais de 20 anos debatendo uma Reforma Tributária, de forma que uma simplificação se mostra mais viável. Se olharmos para os países nórdicos – referência em bem-estar social, competitividade e liberdade econômica –, veremos que têm uma carga elevada, uma eficiência econômica alta e uma complexidade baixíssima. Este é o ponto”, frisou o coordenador.
Na opinião dele, tanto a atuação do Poder Executivo quanto a mobilização da sociedade são essenciais para um avanço neste sentido. Além disso, a demonstração deveria partir do governo, liderando a reforma pela simplificação. “Isso puxaria a pauta e nos ajudaria a chegar a um consenso [com governadores e prefeitos]. É preciso trabalhar com o bom e com o simples, pois o grande erro é tentar fazer a reforma perfeita, pois ela não existe”, Maciel pontuou.
Digitalização na pandemia demostra possibilidade de avanço da desburocratização
A digitalização “forçada” causada pela pandemia foi outro assunto discutido no evento. Ambos os convidados concordam que há vários benefícios que a mudança proporcionou ao setor produtivo, sendo um deles a própria digitalização do governo, sobretudo para exercer políticas públicas e arrecadar recursos, explicou Maciel.
“Quando o governo se digitalizou, várias etapas cartoriais e de reconhecimento de documentos de firma foram abolidas, e o advento da assinatura eletrônica foi muito importante. Algo que surgiu, em meio a isso, foi a proposta de unificação dos cartórios – que nem sequer conversavam –, de forma que o que é reconhecido em um passe a valer para todos. Isso mostra que é possível transformar esta experiência e generalizá-la para outras esferas do governo, representando um ganho de eficiência quanto a horas trabalhadas”, esclareceu o coordenador.
Caiuby ressaltou o benefício que o processo digital promoveu ao setor privado, sobretudo na área da Saúde, ao destravar algumas amarras que dificultavam o acesso pela população. “O exemplo mais tangível é a teleconsulta, cuja digitalização sempre enfrentou muita resistência. O teleatendimento e a integração do prontuário do paciente acessível a qualquer especialista geraram um impacto enorme no setor. Ainda assim, é preciso que a legislação e a regulação pavimentem a estrada da digitalização”, concluiu.
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Crédito das fotos: André Carvalho / UM BRASIL