Brasil não discute soluções para o problema da corrupção
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Embora seja visível que o Brasil tenha intensificado os esforços de combate à corrupção nos últimos anos, teme-se que, em contrapartida, avancem os mecanismos que propagam a impunidade. Essa preocupação, fundamentada no desrespeito às leis e à falta de um debate sobre reformas que inibam a corrupção, foi tema do debate entre o diretor-executivo da Transparência Internacional no Brasil, Bruno Brandão, e o jornalista e fundador do Museu da Corrupção, Moisés Rabinovici.
Brandão comenta que, desde 2012, o Brasil é um dos países que mais piora em termos de percepção da sociedade em relação ao nível de corrupção, de acordo com o índice da Transparência Internacional que avalia o tema em 180 países. Segundo ele, isso se deve às operações de combate às práticas ilícitas no setor público.
“Quando um país começa a confrontar o problema da corrupção de uma maneira mais contundente, o primeiro efeito é sempre uma piora da percepção da corrupção. Ou seja, se percebe mais, porque ela se torna mais visível. Então, isso não é de forma alguma uma novidade. Já vimos isso acontecer em diversos países”, garante.
Rabinovici, por sua vez, demonstra preocupação com a impunidade, dizendo que o Brasil é um país que tem o costume de “dar um jeitinho” de “adocicar” as punições a políticos, de modo que há dificuldade de impor a lei a pessoas em posições de poder.
“Temos sempre uma ‘jabuticaba’ no caminho, estamos sempre punindo com doçura o corrupto e não somos conscientes de que o Brasil está parado no tempo por causa da corrupção”, afirma o jornalista. “Cada vez que permitimos uma violação, seja qual for, grande ou pequena da lei, ela leva consigo muitas outras violações. Esse é o mal do Brasil. Não se cumpre lei aqui. E quando vai cumprir, se é um político, descobre-se um jeito de ‘adocicá-la’”, complementa, em debate promovido pelo UM BRASIL.
Nesse sentido, Brandão avalia que, pior do que casos de corrupção mal resolvidos ou abrandados, é a falta de discussão sobre como resolver o problema. “O Brasil simplesmente não discute reformas ou soluções para o problema da corrupção. Discute quem foi preso, a 48ª fase da Lava Jato, o ‘japonês da Lava Jato’, mas não tem uma discussão sobre uma agenda de reformas sobre o assunto”, assevera.
Ele também afirma que a corrução “nunca foi uma disfuncionalidade do Estado”. Pelo contrário, “ela é perfeitamente funcional para o tipo de Estado que temos, que é extrativista, concentrador, gerador de privilégios e que serve a um propósito determinado desde sua origem e que pouco foi reformado”, ressalta.
Rabinovici conta que teve a ideia de fundar o Museu da Corrupção em 2009, quando trabalhava como editor de um grande jornal em São Paulo. Segundo ele, todos os dias havia um novo caso de ilicitude para noticiar, mas faltava espaço. “A corrupção era um acontecimento diário. Eu dizia para mim mesmo: esse material está sendo perdido.”
Além disso, comenta que, quando era correspondente internacional em Israel, foi à posse do primeiro-ministro Menachem Begin (1977-1983) e pôde presenciar um diálogo que lhe chamou a atenção. “A embaixatriz americana convidou a mulher do Menachem Begin para visitar a embaixada, que lhe perguntou: ‘Que ônibus passa lá?’. Então, essa é a diferença. O político no Brasil se sente poderoso, não tem freios, advoga em causa própria e usurpa o dinheiro que seria destinado à saúde, à educação, e, assim, nós vamos, complacentes”, declara.
O debate foi tema da terceira aula do curso de extensão UM BRASIL Sustentável: visões, desafios e direções, desenvolvido pelo canal em parceria com a Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS) e o Programa de Mestrado em Análise Ambiental Integrada, da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
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