Assunto que tem permeado o debate econômico nos últimos anos, o déficit fiscal ocorre quando a arrecadação tributária não dá conta de pagar todo o gasto do setor público. Para contornar esse rombo, o Estado brasileiro, proibido de emitir moeda e praticamente sem condições de elevar ou criar impostos, tem aumentado o seu endividamento. Mas há um preço a pagar por essa política.
Desde 2014, o governo brasileiro gasta mais do que arrecada. De acordo com o ex-ministro das Finanças do Chile e reitor da Escola de Política Pública da London School of Economics and Political Science (LSE), Andrés Velasco, esse problema se deve ao aumento do gasto público realizado durante o ciclo de alta dos preços de commodities na década passada e a erros de política econômica durante a crise internacional iniciada em 2008.
“Historicamente, muitos produtores de commodities, inclusive a América Latina, quando há uma alta repentina dos preços, têm uma alta nos gastos e também no crédito. Qual é o problema? Que essas altas em algum momento terminem e os países acabem com muitas dívidas”, explica Velasco.
Segundo ele, quando a crise financeira estourou nos países desenvolvidos, o Brasil acertou ao adotar uma política econômica anticíclica. Contudo, o que devia ser uma ação temporária se prolongou por anos. “Quando a crise começa, você gasta mais; quando a crise termina, você gasta menos. O Brasil continuou gastando, não só em 2009, mas em 2010, 2011, 2012, 2013, e a consequência é muito clara: hoje, o Brasil está em uma bagunça fiscal e isso é ruim para o crescimento, porque requer um grande ajuste fiscal”, salienta.
O ex-presidente do Banco Central e estrategista-chefe da Rio Bravo Investimentos, Gustavo Franco, explica que, por muitos anos, o Estado brasileiro se valeu da inflação por emissão monetária para cobrir o déficit fiscal. “Uma vez que não tem mais a inflação, a solução tem sido o endividamento, que é também tributar um ausente, que são os nossos descendentes que vão pagar essa conta no futuro. É uma espécie de luta de classes intergeracional. Estamos explorando os que nem nasceram ainda”, alerta.
No que diz respeito às contas públicas, Franco diz que a solução envolve discutir o orçamento federal, porque se costuma fingir que não existe limite para os recursos do Estado. Assim, ele aponta que o Brasil precisa reavaliar seus impostos.
“Tudo que é privilégio é imposto. Temos horror a imposto, mas não aos privilégios. Por quê?”, questiona. “Se continuar do jeito que está, o Brasil quebra, e dessa vez não é quebrar contra o estrangeiro por causa da dívida externa. É a incapacidade de o Estado pagar a dívida interna”, frisa.
O diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), vinculada ao Senado Federal, Felipe Salto, argumenta que, “sem mudanças na Previdência, nos gastos com pessoal e nas despesas obrigatórias do Estado, vai ser muito difícil reequilibrar as contas públicas”.
Segundo Salto, a função das finanças públicas é combinar os instrumentos disponíveis, sobretudo impostos e dívida, para que o Estado providencie políticas públicas que a sociedade deseja. Dessa forma, os recorrentes déficits comprometem a execução de programas governamentais.
“O espírito da responsabilidade fiscal pode ser resumido em uma frase: não podemos gastar mais do que aquilo que temos capacidade de arrecadar”, pontua. “Um Estado probo, eficiente, que cuide bem das finanças públicas necessariamente vai implicar em políticas públicas bem-feitas”, assegura.