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Economia e Negócios

fev 08, 2023

Desenvolvimentismo e inclusão social: soa bem, funciona mal

É preciso cuidado com o receituário “batido”, implementado e testado diversas vezes no Brasil e em outros países, que resulta em crises econômicas ainda piores do que as que se propunha corrigir

Por Eduardo Coutinho e Ari F. Araújo Jr.*

A volta da esquerda ao poder no Brasil traz consigo o apelo à inclusão das camadas mais pobres da população. Não há como se opor a este chamado. Vivemos em um país que carrega muitas marcas da pobreza, como a ausência de saneamento básico para uma parcela significativa das pessoas. Contudo, o problema não está no diagnóstico, mas nas soluções propostas.

Os titulares da Fazenda, da secretaria-executiva deste ministério e da presidência do BNDES são personagens conhecidos pelas convicções desenvolvimentistas, pela ampliação dos gastos públicos e pela política monetária expansionista. Estes posicionamentos são apresentados como veículo da inclusão social. Trata-se de receituário batido, implementado e testado diversas vezes no Brasil, mas também mundo afora. O resultado? Crises econômicas ainda piores do que as que seriam corrigidas.

Ao contrário do que a corrente desenvolvimentista propaga, há ampla evidência estatística que demonstra a relação entre controles fiscal e monetário e crescimento econômico. Não é uma crença, mas fruto de resultados observados a partir do estudo sistemático de dados econômicos, mediante a utilização de modelos matemáticos testados e sob constante evolução.

A riqueza de um país não vem da quantidade de dinheiro em circulação e dos gastos descontrolados de governo, mas da capacidade de produção de bens e serviços por parte de empresas e indivíduos, a qual depende essencialmente de investimentos em máquinas, instalações físicas e tecnologia, que dão mais eficiência. Considerando que a recuperação destes investimentos é, em geral, lenta, a trajetória de longo prazo da economia é fundamental. Se o futuro espelhar mais inflação, juros altos e mercado consumidor em declínio, os investimentos não são realizados. A contribuição do governo deveria ser, desta forma, com poupança positiva. Isto é, o esforço de geração de poupança não deveria recair unicamente sobre o setor privado.

E como isso se conecta à agenda do governo? Com base nos posicionamentos públicos de Haddad, Galípolo e Mercadante, a agenda econômica será baseada no mesmo receituário que balizou as decisões de política econômica desde meados da década de 1970 até o fim dos anos de 1980 e o período que vai do segundo mandato de Lula até o governo Dilma: expansão fiscal, política monetária expansionista, crédito direcionado (bancos estatais) a juros subsidiados e política industrial ativa (campeões nacionais, por exemplo).

O ponto importante a ser observado é que esse receituário falhou não por falta de sustentação política – ou da tal vontade política. Por que, então?

1) O resultado natural de excesso de oferta de uma mercadoria é a queda no seu preço. Moeda é uma mercadoria como outra qualquer, e um aumento de oferta descolado do aumento na produção de bens e serviços faz o preço cair. O nome disso é inflação.

2) Descontrole fiscal eleva incerteza quanto à capacidade de o governo honrar os compromissos. Qualquer agente econômico está sujeito a esta crise de desconfiança. Para viabilizar novos financiamentos, torna-se necessário oferecer taxas de juros cada vez mais elevadas para compensar o maior risco de inadimplência – e isso se reflete nas demais taxas de juros praticadas no mercado financeiro, encarecendo o crédito para todos.

3) Muitas vezes, escutamos que basta o governo emitir dinheiro para pagar a dívida e o problema se resolve. Volte ao item 1, por favor.

4) Tecnicamente falando, o crédito direcionado distorce preços relativos. O modelo adotado nos períodos citados combinou crédito direcionado a um subsídio sob a forma de juros inferiores aos praticados em mercado de recursos livres. Mais abundância de crédito barato atrai mais tomadores, que irão utilizar estes recursos para financiar projetos de investimentos que não seriam viáveis na sua ausência. Além da alocação ineficiente, este tipo de política não imuniza os investimentos em relação a choques externos. Os efeitos dos subsídios funcionam em prazos mais curtos, porém não se sustentam no longo prazo.

Os resultados do que foi descrito já são bem conhecidos: inflação, juros elevados e baixo crescimento. E quem são os maiores prejudicados? A resposta não exige muito esforço reflexivo, mas parece ficar esquecida. Assim, iremos descrever os efeitos nocivos dessas políticas sobre aqueles que se pretende ajudar.

A elevação da inflação prejudica essencialmente os de menor renda. Aqueles que gastam tudo que ganham sofrem os efeitos da inflação sobre toda renda que são capazes de gerar. Aqueles que conseguem poupar parte de sua renda conseguem atenuar ou, até mesmo, se beneficiar do processo inflacionário. Juros mais elevados também não trazem benefício aos menos favorecidos. Novamente, os grandes beneficiados são os de renda e patrimônio mais altos. Estes dispõem de recursos para aplicar em ativos financeiros com elevada remuneração e ampliar ainda mais a riqueza.

E o crédito subsidiado? Mais uma vez, os menos favorecidos ficam de fora. Os beneficiados são aqueles que conseguem acesso a ele. Ainda que a intenção declarada seja atingir empreendimentos de menor porte, a implementação desse tipo de política implica a canalização de volumes elevados de recursos para grandes empreendimentos. Este é um resultado esperado, uma vez que obter esses financiamentos em bancos estatais exige do tomador um conjunto complexo de exigências que estão além da capacidade dos negócios de menor porte. Além disso, esses financiamentos serviram para viabilizar investimentos em estádios, fusões de grandes empresas (como Sadia e Perdigão), constituição e desenvolvimento do Grupo X (de Eike Batista) e construção de obras em vários países, alguns deles que se tornaram inadimplentes, para lembrar de alguns casos mais recentes.

Infelizmente, estamos diante de uma agenda econômica ruim e que produz resultados ainda piores. Há farta evidência disso na literatura econômica e no resultado prático dessas políticas no ambiente econômico. A melhoria das condições de vida dos menos favorecidos depende de ambiente econômico estável que possa incentivar investimentos privados na produção de bens e serviços e investimentos em infraestrutura (públicos ou privados), sem falar em ensino básico de qualidade, que também faz parte das promessas – mas, até aqui, parece um sonho distante.

* Eduardo Coutinho é gerente acadêmico e coordenador do curso de Administração da Faculdade Ibmec Belo Horizonte; Ari F. Araújo Jr. é coordenador do curso de Ciências Econômicas da Faculdade Ibmec Belo Horizonte

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