Trajetória fiscal brasileira é insustentável
ENTREVISTADOS
MEDIAÇÃO
O desequilíbrio entre as receitas e despesas públicas vai resultar em alguns anos no calote da dívida interna ou na explosão da inflação. Diante dessa possibilidade, a elaboração de reformas é crucial para equilibrar as contas do sistema tributário brasileiro e impedir uma piora da crise fiscal.
As mudanças necessárias para tornar o sistema saudável foram debatidas na quarta aula da série UM BRASIL Sustentável, que contou com o professor de Economia das Faculdades Oswaldo Cruz e da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), Odilon Guedes, e o diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCFi), Bernard Appy. O curso de extensão foi desenvolvido pelo canal em parceria com a Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps) e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
A diminuição da tributação indireta para as empresas é uma das saídas apontadas por Guedes para corrigir parte dos problemas da arrecadação. “O Brasil tem uma injustiça, porque a maior parte da carga tributária é indireta (sobre os bens que a gente consome), e isso penaliza a população de baixa renda. A redução nos custos das empresas seria repassada aos produtos, e isso beneficiaria, principalmente, essa população. O governo compensaria essa perda de receita tributando diretamente a renda, a propriedade e a herança – o que, aliás, já ocorre nos países desenvolvidos”, explica.
Outro problema destacado pelos economistas é a rigidez do orçamento brasileiro, que vincula a receita de cada imposto a um ou a vários objetivos, como saúde e educação. Uma das maneiras de driblar essa estrutura resultou na Desvinculação de Receitas da União (DRU), instrumento financeiro que desassocia as receitas do direcionamento para o qual elas foram criadas.
“Os principais impostos federais estão ‘amarrados’. O governo não tem instrumento para aumentar a receita dos tributos de consumo e renda porque o orçamento está todo vinculado. O debate democrático sobre o orçamento se perdeu no nosso País, e temos que desmontar esse sistema”, enfatiza Appy.
O diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCFi) acredita que a análise da política fiscal deve considerar as seguintes dimensões: a quantitativa (que é a soma da receita e despesa), o lado qualitativo (como são feitos a arrecadação e os gastos) e a dimensão distributiva, ou seja, qual o impacto da política fiscal sobre a distribuição de renda no País. “Temos de olhar o lado da receita e do gasto juntos. Olhar apenas um leva a conclusões equivocadas. Atualmente, temos uma trajetória explosiva da dívida pública, arrecadamos e gastamos mal e uma parcela relevante das pessoas de alta renda paga pouco imposto”, resume Appy.
Os economistas também comentam sobre a concessão de benefício tributário para empresas consideradas sustentáveis. Enquanto Guedes entende que a exoneração é o melhor caminho, Appy afirma ser mais eficiente cobrar imposto de quem prejudica o meio ambiente. “No desenho de um bom sistema tributário, há espaço para tributos ambientais. Não me refiro ao aumento de carga tributária, mas é possível criar tributos ambientais e reduzir outros”, diz Appy.
ENTREVISTADOS


CONTEÚDOS RELACIONADOS

Brasil encontra dificuldade para gerar receita acima dos gastos
Para Silvia Matos, do ‘Boletim Macro IBRE’, País está no negativo há mais de dez anos
ver em detalhes
Brasil e mundo vivem uma nova era geopolítica e tecnológica
De acordo com o cientista político Carlos Melo, a reorganização das forças globais deu origem a uma nova era “pós-Ocidente”
ver em detalhes
Na reforma do Estado brasileiro, foco deve estar no cidadão e no controle de gastos
Segundo Marcos Lisboa, ex-presidente do Insper, e Felipe Salto, sócio da Warren Investimentos, é preciso superar o modelo federativo, que se esgotou
ver em detalhes