Tradicional no Brasil, presidencialismo de coalizão inibe função fiscalizadora do Poder Legislativo
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No Brasil atual, o Congresso Nacional vive um processo de cartelização, no qual os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados se veem cada vez mais fortalecidos. Ao mesmo tempo, em razão do presidencialismo de coalizão – modelo em que o governo forma uma aliança com partidos que lhe dão sustentação no Parlamento –, o Poder Legislativo tem se limitado a legislar, relegando a função fiscalizadora a momentos delicados da política nacional.
Esta é a avaliação de Magna Inácio, professora de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e especialista na relação entre os poderes Legislativo e Executivo, em entrevista ao UM BRASIL, uma realização da FecomercioSP.
De acordo com Magna, o presidencialismo de coalizão é um dos motivos para que as indicações do Palácio do Planalto para postos de autoridade, como os de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e os de diretores de agências reguladoras, não sejam barrados no Congresso.
“Historicamente, o nosso Legislativo tem exercido a função fiscalizadora [de forma] muito tímida e limitada. Isso tem a ver com a forma como os governos são formados no Brasil, em que os partidos formam coalizões lideradas pelo presidente”, reforça Magna, também pesquisadora e PhD pela Universidade de Oxford.
“Quero dizer, os partidos no Legislativo estão no Executivo participando do governo, e isso, ao longo do tempo, de certa forma, desmobilizou a atividade fiscalizadora, a não ser em momentos de conflitos mais acirrados e em situações que são muito visíveis e salientes para o eleitor”, complementa.
Neste sentido, Magna aponta os impeachments dos presidentes Fernando Collor de Mello, em 1992, e Dilma Rousseff, em 2016, como momentos atípicos da história do Congresso Nacional.
“Tivemos dois episódios de impeachments concluídos, mas isso não significa que, no dia a dia, o Legislativo tenha exercido esta função de maneira tão continuada ou sistemática. E nós pagamos um preço por isso”, pontua. “O que este cenário deixa claro é que, quando o Legislativo quer, ele tem capacidade, força e mecanismos para fazer”, salienta.
Sistema bicameral
A professora de Ciência Política explica que, no Brasil, o bicameralismo – com o Senado sendo o representante dos Estados, e a Câmara, o dos cidadãos – é marcado pelo equilíbrio entre as duas casas.
Apesar de ambas sofrerem com o “hiperpresidencialismo” resultante da cartelização em torno de seus presidentes, aponta que este processo é mais forte na Câmara, onde o Executivo, inclusive, tem mais penetração por meio das coalizões.
“Certos danos têm sido contidos, do ponto de vista da qualidade das leis e do debate, fundamentalmente pelo papel do Senado de refrear esta lógica de urgência, de atropelo, de ‘passar a boiada’, com uma análise mais cuidadosa e um processo mais próximo do que esperamos”, destaca Magna.
“Então, acho que isso mostra a força e a importância do bicameralismo, na medida em que certas decisões, sem discussão e debate com a sociedade, hoje, poderiam estar aprovadas se prevalecesse a vontade da Câmara dos Deputados e, principalmente, do seu presidente”, ressalta.
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