A guerra entre Rússia e Ucrânia simboliza o fim de um período no qual havia apenas uma potência no mundo. Após três décadas de supremacia, o sistema unipolar, regido pelos Estados Unidos, está saindo de cena. Em seu lugar, emerge uma disputa que deve interpor limites e alimentar tensões entre três nações poderosas dos pontos de vista econômico e militar. No meio disso, o Brasil, sem se alinhar a nenhum lado, precisa cumprir o objetivo da política externa: colher benefícios para o seu desenvolvimento. Isso é o que pensa Carlos Gustavo Poggio, pesquisador e professor de Relações Internacionais da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap).
Em entrevista ao UM BRASIL, uma realização da FecomercioSP, Poggio, analisando a invasão russa ao território ucraniano, destaca que o mundo pós-Guerra Fria, no qual os Estados Unidos ditaram as regras, está ruindo. A ascensão da China e a proeminência da Rússia estão causando uma “mudança estrutural”, de modo que seja importante que o Brasil saiba se adaptar ao novo cenário.
“No mundo multipolar, se você não se amarrar necessariamente a nenhum dos polos, consegue extrair vantagens”, indica Poggio, também PhD em Estudos Internacionais pela Old Dominion University.
“Qual deve ser o objetivo e a diretriz da política externa brasileira? O Brasil é um país em desenvolvimento, precisa de recursos e investimentos. Podemos conseguir isso diversificando. Então, o ideal é o País saber jogar com estas diferenças para trazer benefícios maiores. O objetivo da política externa é beneficiar a população brasileira”, complementa.
Na avaliação do especialista, ainda é cedo para mensurar os efeitos colaterais das sanções à Rússia, impostas em volume inédito, na economia brasileira. De todo modo, Poggio teme que o conflito no Leste Europeu contamine ainda mais a polarização política e atinja a diplomacia do País.
“O Brasil estará, teoricamente, bem equipado para lidar com este mundo [das grandes potências] se souber voltar às origens e às tradições da diplomacia brasileira, que estão ligadas ao multilateralismo e à busca negociada pelos acordos”, salienta. “Então, o Brasil tem, se souber aproveitar a qualidade da nossa diplomacia, como se inserir nisso de forma vantajosa”, acrescenta.
Guerra na Ucrânia
De acordo com Poggio, a invasão à Ucrânia ocorre como forma de o Kremlin dizer que chegou a hora de rediscutir o sistema internacional, de modo que a Rússia não se postará como coadjuvante.
“[A guerra] é muito além da Ucrânia. O país é só um objeto neste jogo das grandes potências”, frisa.
O professor de Relações Internacionais também afirma que, independentemente dos bombardeios ao território ucraniano, o presidente russo, Vladimir Putin, “já perdeu” a guerra, porque não conseguiu alcançar os objetivos políticos que almejava com o conflito armado.
“Acho que Putin cometeu um erro estratégico gravíssimo, porque tudo o que ele queria aconteceu ao contrário. Qual é o seu grande objetivo nos últimos 20 anos? Semear divisão entre os europeus”, explica o pesquisador. “O que vimos nesta crise, rapidamente, foi um processo muito grande, como nunca se viu, de integração europeia. A Europa agindo de forma unida e rápida”, avalia.
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Crédito da foto: Rafayane Carvalho/Faap