Mundo vive o período mais imprevisível e turbulento dos últimos 30 anos
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A humanidade vive em um mundo com um cenário bem mais turbulento, imprevisível e inquieto, do ponto de vista geopolítico, do que há 20 ou 30 anos, avalia o jornalista e palestrante Jaime Spitzcovsky, que fez coberturas jornalísticas de fatos marcantes na história, como as desintegrações da Iugoslávia e da União Soviética (URSS), a morte de Deng Xiaoping e a devolução de Hong Kong à China.
Para Spitzcovsky, vive-se atualmente os primórdios da formação do mundo multipolar. “Na Guerra Fria, sobretudo a partir da crise dos mísseis de Cuba, em 1962 [confronto entre os Estados Unidos e a União Soviética relacionado à implantação de mísseis balísticos soviéticos em Cuba], havia um grau de previsibilidade entre Moscou e Washington, acentuada, posteriormente, no período de hegemonia norte-americana”, explica.
Já no mundo multipolar, há um processo de busca de reacomodação de forças políticas, econômicas e militares, com dois movimentos antagônicos: de um lado, os Estados Unidos e a União Europeia, tentando frear uma perda do poder relativo; do outro, a China e a Índia, dois grandes polos de poder em ascensão, desejando ampliar a participação global. “O choque entre esses dois movimentos antagônicos produz essa turbulência e o fato de vivermos em um mundo mais imprevisível, com um número maior de conflitos”, completou o jornalista, durante a palestra no evento de comemoração dos dez anos do Canal UM BRASIL — uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP). Em paralelo, outros países sem os mesmos pesos político, econômico e militar, mas que são players fundamentais na reacomodação das forças do cenário internacional, buscam também se reposicionar, casos de Rússia, Japão, Indonésia, Arábia Saudita e o próprio Brasil.
Diante desse panorama histórico e turbulento, Spitzcovsky, que é entrevistador do UM BRASIL desde 2018, enxerga com preocupação o choque de nacionalismos extremados e o avanço de projetos e agendas populistas, sejam de esquerda, sejam de direita. “Os movimentos nacionalistas de China e Índia colidem com Estados Unidos e Europa, que são sociedades democráticas”, exemplifica. A despeito dessa tensão entre os países, algumas agendas comuns importantes precisam ser exploradas pelos principais players do cenário internacional, como a questão climática, a segurança alimentar, a ameaça do terrorismo e o tema nuclear, que necessitam da construção de diálogos com essas potências emergentes.
O papel do Brasil no cenário internacional
Em meio às incertezas, o jornalista considera importante que o Brasil não tenha um alinhamento automático com nenhum desses polos de poder: os Estados Unidos, a Europa, a China e a Índia. “O País deve determinar a própria agenda, guiada pelos interesses nacionais, e manter uma equidistância em relação a esses países.”
Integrante do Grupo de Análise da Conjuntura Internacional da Universidade de São Paulo (USP), o palestrante acredita que o Brasil deve buscar o protagonismo e ser uma peça ativa em âmbito internacional. “É preciso resgatar o peso inerente do País no contexto externo, e o caminho é o concentrar esforços de inserção e participação internacional em áreas nas quais reúne inequívocas e reconhecidas lideranças, como segurança alimentar, agronegócio e questões ambientais”, destaca.
Spitzcovsky considera um equívoco a utilização da política externa como uma plataforma de interesses de governo, e não de Estado. “Ao longo dos últimos anos, diferentes governos usaram as relações exteriores como veículo para a aplicação de agendas ideológicas, políticas e partidárias, e não necessariamente como uma política estatal. Isso precisa estar a serviço do desenvolvimento econômico e da consolidação da democracia”, concluiu.
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