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Não é do interesse do Brasil se posicionar no conflito geopolítico e econômico entre China e Estados Unidos (EUA), considerando que o País mantém parceiros estratégicos em todos os lados envolvidos. Contudo, ainda que esteja “condenado” a fazer um jogo intermediário, a Nação ainda falha em colher os frutos advindos dessa postura mais cautelosa, de forma que perde oportunidades comerciais importantes com as duas nações mais ricas do mundo. Para Ricardo Sennes, economista, cientista político e sócio-diretor da Prospectiva Public Affairs e Negócios, o grande risco que temos corrido é o de“sair de mãos vazias” no relacionamento com ambos.
Na sua visão, o País atua com uma agenda negativa e vazia na relação com as duas potências. Em entrevista ao Canal UM BRASIL, uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), Sennes exemplifica com a viagem do governo brasileiro ao país norte-americano no início do ano e menciona que perdemos a oportunidade de envolver o Brasil na nova escalada tecnológica estadunidense — uma iniciativa de centenas de bilhões, para fabricação de semicondutores, que deve gerar profundos impactos financeiros a países vizinhos. “A política norte-americana referente à produção e à fabricação de semicondutores tem muito espaço para o Brasil, sem necessariamente representar uma afronta à China. Da mesma forma, temos muito espaço na China — sem criar conflitos com os Estados Unidos — que não estamos aproveitando”, pondera Sennes.
O cientista político ainda lembra que outras nações comercialmente importantes, como Índia e Indonésia (com dinamismos econômicos gigantes) estão fora do radar brasileiro. “Há uma parte do mundo para a qual simplesmente não olhamos. Não está no debate público ou na diplomacia”, complementa, “mantendo-se nesse meio-termo em que estamos condenados a ficar e, ainda assim, sem muitos ganhos”, sinaliza.
Esta é a segunda gravação realizada em parceria com a Exame, comandada pelos jornalistas Jaime Spitzcovsky e Luciano Pádua (editor de Macroeconomia da revista).
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Sennes também pondera que há um enorme espaço para ganhos econômicos a partir de uma relação comercial mais próxima com os países vizinhos do Brasil. O problema atual é que as políticas regionais do País estão em descompasso com os desafios e as oportunidades regionais, independentemente dos polos políticos que têm se alternado no poder.
“Do ponto de vista econômico, não basta uma abertura unilateral, e desagravamento generalizado, para se gerar um dinamismo regional e capturar o que se poderia ter em termos de uma economia circular. Por outro lado, tampouco é uma política de comércio administrado, baseada em acordos automotivos, que fará isso”, complementa. “Nenhum dos dois polos políticos encontrou uma forma de destravar as atuais barreiras, que não são mais tributárias ou de tarifas, mas regulatórias e de alinhamento de questões técnicas — ao mesmo tempo que se fomentam as indústrias ou os segmentos com ganhos para fazer o jogo com o restante do mundo. Nossa região é uma potência energética, mas nossa matriz é totalmente isolada. Os grupos que olham para a questão regional, infelizmente, estão com agendas ultrapassadas”, adverte o economista.
Reformas Política
Outro tema do bate-papo é a necessidade de uma Reforma Política diante dos vários sinais de desaprovação, pela sociedade, do atual sistema. Para Sennes, o País “peca” fortemente em sustentar o atual modelo por meio do qual os parlamentares são eleitos, assim como a falta de controle sobre a atuação desses agentes públicos.
“O ‘distritão’, em que o candidato é eleito para representar o Estado inteiro, é um dos principais fatores para o desgaste do principal órgão de representação: o Congresso. [O parlamentar] está isento quanto ao distanciamento, à capacidade de operar de maneira muito livre com a sua base, ao controle sobre ideias, às questões de comportamento etc. Desde que leve um pouco de recurso para a sua base, [já pensa que] é suficiente. O tema número um da Reforma Política é mexer nisso, o começo de todas as outras mudanças políticas”, argumenta.
Ele ainda cita uma transformação importante que o parlamento brasileiro tem passado. “Há uma redução do nível de representação no Congresso. Hoje, não se acham mais os grandes economistas, juristas ou especialistas em Saúde, aquele conjunto de especialistas em áreas que tivemos entre os anos 1980 e 1990. Atualmente, há uma grande presença e dominância do politico mediano, e isso muda o jogo. Um debate econômico entre os formuladores [eleitos] é algo que já se perdeu”, conclui.