O ódio e a polarização que emergem nas redes sociais, além do uso indevido da Inteligência Artificial (IA), estão criando um problema enorme para as democracias. As eleições, por exemplo, um dos maiores símbolos do funcionamento de um sistema representativo, também têm se mostrado motivo de hostilidade e divisão na sociedade, muito por causa da velocidade com que mentiras surgem e se espalham nas redes, grande parte delas criadas por IA.
Isso também está tornando o mundo um lugar mais perigoso. E são as ditaduras, controladoras do uso dessas ferramentas, que estão obtendo vantagem de ganho e escala econômica diante da instabilidade em países liberais, os que mais dependem de boas relações sociais e emocionais. “A sociedade livre sempre foi capaz de produzir resultados econômicos melhores no longo prazo. Pela primeira vez, a equação está mudando. Essa instabilidade interna chega ao ponto de comprometer a performance econômica. As democracias precisam encontrar uma maneira de sobreviver no ambiente digital, que é justamente não se fragmentar, não se ‘matar’ e não se odiar”, afirma Heni Ozi Cukier, cientista político, professor e palestrante.
Isso se torna ainda mais preocupante em um ano em que metade da população global participará de eleições. “A coesão das democracias foi rompida, porque se dividiram por questões ideológicas. Isso as torna fracas, e o outro lado, as ditaduras, sente que é hora de continuar avançando. Isso é irreversível até que o mundo encontre um novo capítulo de como fazer política e conviver na era das redes sociais sem se polarizar, bem como que saiba como administrar a IA em campanha política. Nada disso vai embora, só agravará o cenário. A incerteza que temos é apenas em relação à velocidade com que isso ocorrerá”, complementa Cukier.
“Podemos ter um grande conflito causado por essas tecnologias, não entre países, mas de elas destruírem as relações humanas de muitas maneiras. O ano de 2023 foi a consolidação das IAs de domínio da linguagem, e isso tem um impacto imenso ao mundo. Ainda não sabemos como esse fator mudará a natureza das nossas relações. Imagine pegar tudo o que as redes sociais fizeram para o ambiente político do mundo e potencializar por mil”, frisa.
A postura do Brasil no ambiente geopolítico
Ainda segundo o cientista político, os governos brasileiros persistem em seguir linhas ideológicas nos tratos das relações exteriores, deixando de lado o pragmatismo. Neste momento, a direção ideológica que o País toma é preocupante por não se opor à criação do eixo das ditaduras, com o Brics abrindo as portas a essas nações, adverte.
“Vai chegar uma hora em que será impossível de nos desligarmos disso. Da forma como está, hoje, quando tivermos de tomar um lado, parece que será o lado errado, o do mundo não livre”, pondera. “O Brics decidiu se expandir para se tornar um grande bloco de ditaduras. Esses países [do bloco] farão muita diferença para impulsionar ou frear as rédeas em direção a este lugar para onde o mundo está caminhando”, enfatiza.