Por Eva Renon
Podemos definir o lobby como um processo de conversação público-privada inserido em sociedades democráticas e seus desafios econômicos. Nesse contexto, essa atividade tanto pode contribuir para ajudar os políticos a obter um melhor senso de realidade enquanto compartilham dados quanto para promover os estreitos interesses de negócios poderosos. Portanto, a corrupção é uma manifestação desviante e criminosa do lobby, em que atores públicos e privados colocam em primeiro lugar o interesse pessoal – dinheiro para evitar que uma lei seja aprovada, a oportunidade de pagar menos impostos ou conseguir contratos públicos – desrespeitando o que poderia ser uma decisão melhor para “99%” da sociedade. Na ausência de uma regulação que promova a transparência dessa atividade, não há como distinguir a forma positiva do lobby da outra – a negativa.
No Brasil, iniciativas visando a essa regulação andam a passos lentíssimos. Um exemplo é o Projeto de Lei n.°1202/2007, apresentado pelo deputado Carlos Zarattini (PT), que tramita na Câmara dos Deputados há mais de uma década e pretende estabelecer regras para a atuação dos grupos de pressão no âmbito dos órgãos e entidades da administração pública federal. Até o fechamento desta edição, ele aguardava na fila para votação em Plenário.
A intenção da proposta é contribuir para que a sociedade tenha mais controle sobre a atividade, limitando a conduta dos lobistas e dos servidores públicos para evitar abusos e conflitos de
interesse. Entretanto, o substitutivo da relatora, a deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), introduziu algumas mudanças na proposta inicial que limitam esse alcance. Uma delas foi retirar a obrigatoriedade do cadastro nacional de lobistas, que seria público e permitiria que a população pudesse ajudar no controle do exercício da atividade. O registro online e a divulgação das reuniões pelo mesmo modelo são essenciais para prevenir operações fora da lei.
Bem regulamentado e transparente, esse canal de participação seria valioso para associações empresariais menores, que, apesar de representarem o maior segmento do setor de negócios do Brasil, não estão bem representadas no processo de formulação de políticas. Por meio do lobby, sua voz poderia contrabalançar interesses mais poderosos e mais restritos, desafiando-os no Congresso. Para que isso aconteça, a regulamentação do lobby deve criar espaço para a representação política das associações empresariais menores, sem recursos e profissionalização, ao mesmo tempo que suaviza a influência de associações ou empresas maiores e mais ricas.
Como? Com registro obrigatório barato, acessível a instituições como sindicatos e associações setoriais – e proibindo-se o registro das empresas –, para evitar beneficiar as maiores em detrimento das menores. A ampla divulgação das reuniões deve informar qual lobista participa de eventos informais na preparação das comissões (workshops); qual lobista fica em cada comissão; se o lobista foi convidado pelos legisladores para contribuir como representante da sociedade ou se ele pediu para participar. Essas medidas reduzem custos para governos e pequenas associações e tornam os dados amplamente disponíveis para acadêmicos e público em geral.
Esse também poderia ser um canal importante para os sindicatos patronais locais, enfraquecidos com a Reforma Trabalhista (Lei n.º 13.467/2017), que tornou as contribuições financeiras das empresas opcionais. Entidades representativas dos setores econômicos, como a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) poderiam organizar cursos de capacitação para articular demandas setoriais claras e realizar monitoramento legislativo.
*Eva Renon é doutoranda em Ciências Políticas na University College London (UCL), Instituto das Américas
Artigo publicado na revista Problemas Brasileiros, edição especial de setembro de 2018.