Mais empoderado desde 1988, Judiciário brasileiro tem atuado para conter violações à ordem democrática
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O Brasil possui um Poder Judiciário que tem freado atos que podem romper a ordem democrática, que está presente e que teve uma atuação importante na defesa do estado de direito. Desse ponto de vista, é um papel que tem de ser aplaudido, apesar das críticas que são necessárias, afirma a cientista política e professora da Universidade de São Paulo (USP), Maria Tereza Sadek, uma das mais respeitadas pesquisadoras de Justiça do Brasil.
Em entrevista ao UM BRASIL, uma realização da FecomercioSP, Maria analisa o desenvolvimento do Poder Judiciário brasileiro ao longo do século 20 e avalia o estado atual, em que há críticas crescentes sobre uma atuação “ativista” e, também, a respeito de conflitos com outros poderes.
“O Judiciário foi muito empoderado na Constituição de 1988, que consagrou direitos como nenhuma Constituição brasileira anterior. Temos direitos de primeira, segunda, terceira e quarta gerações, civis, políticos, sociais, ambientais, e de uma vida social digna, como poucas [Constituições] no mundo”, ela esclarece. “Como cabe ao Judiciário atuar quando tais direitos não são respeitados, obviamente ficou muito empoderado; além disso, o acesso a ele foi democratizado.”
Ela pondera que o Judiciário não pode agir de modo próprio, de ofício, tem que ser provocado, e este Poder vem sendo muito provocado desde 1988, “se tornando uma arena pública conveniente sobretudo para partidos minoritários”, Maria frisa. “Toda vez que a minoria perde um debate qualquer no âmbito do Parlamento, pode apelar ao Poder Judiciário. Isso tradicionalmente é chamado de protagonismo do Poder, não ativismo, pois não atua por que quer, mas por que é provocado.”
“[Ainda assim,] Muitas vezes o Judiciário não se contém e extrapola o seu papel, acaba legislando e interferindo em demasia naquilo que seria uma atribuição típica de outros poderes. Contudo, não existe vácuo no poder. Isso cria uma situação de forte embate entre as instituições, que tentam chamar para si o maior número de atribuições”, reflete a pesquisadora.
A respeito das críticas que o Judiciário recebe de forma constante, ela sinaliza que, se forem feitas de forma racional, sem que se coloque uma força ideológica muito forte, elas sempre podem funcionar no aprimoramento da instituição. “Mas quando se faz um ataque irracional, que foge da liturgia dos diferentes cargos, se tem um embate que é destrutivo e que reduz muito a força das instituições. É contra isso que nós temos que nos colocar”, pondera.
Diversidade no Poder Judiciário brasileiro
Maria também comenta o processo de inclusão pelo qual o Poder Judiciário brasileiro tem passado nas últimas décadas, se tornando mais diversificado.
“Antigamente, era quase como uma oligarquia: o juiz era filho de outro juiz que, por sua vez, era neto de outro, etc. Era uma relação muito forte. Como resultado, nós tivemos uma democratização no acesso [a essa carreira] que é dada pela forma como se ingressa. Desde sempre foi concurso, mas temos uma etapa que, no passado, fazia com que candidatos não conseguissem se transformar em juízes: o exame oral. Sendo que a cultura predominante imperava. Pessoas de origem muito humilde não entravam, tampouco pessoas com orientação sexual diferente da predominante; mulheres tinham dificuldade [de acessar a carreira].”
Atualmente, há um grande porcentual de juízes cujos pais não concluíram o ensino básico, e estas pessoas conseguem entrar na carreira pelo mérito. Ainda assim, enfatiza Maria, essa diversidade ainda não alcançou a todas as instâncias do Judiciário. Um exemplo é o Supremo Tribunal Federal (STF), no qual só há duas mulheres na composição vigente.
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Foto: Instituto de Estudos Avançados da USP
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