Nos últimos anos, restrições orçamentárias afetaram a produção científica em unidades de pesquisa, laboratórios e universidades públicas. Mas as perspectivas futuras são positivas. É o que avalia Rodrigo Capaz, doutor em Física e diretor do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM).
“Apesar de haver um grande passivo que a gente precisa recuperar, temos uma visão mais otimista para o futuro”, afirma Capaz, que hoje lidera o Laboratório Nacional de Nanotecnologia do CNPEM, dedicado a pesquisar, desenvolver e apoiar projetos ligados à nanotecnologia.
Para Capaz, falar em nanotecnologia na sociedade ainda é um desafio. Por ser uma ciência aplicada em escala nanométrica, as pessoas têm dificuldade em compreendê-la. Ao mesmo tempo, a sua importância e a das tecnologias quânticas – que se relacionam com esse campo – têm sido cada vez maiores.
“Essa ciência, que é nova e multidisciplinar, tem inserções em várias áreas da sociedade, na saúde, energia e materiais renováveis, segurança”, defende Capaz.
Mas, apesar da enorme relevância desse setor científico, o Brasil ainda está atrasado no tema. “Países com mais recursos estão bem mais avançados. Já existe o embrião de uma iniciativa nacional na área de tecnologias quânticas e uma percepção do estado brasileiro que essa é uma área importante. Ao longo dos anos, desenvolvemos inteligência, formamos pessoas. Mas temos pouco investimento na parte de dispositivos quânticos”, reflete Capaz.
A conversa sobre os desafios e o futuro da nanotecnologia e das tecnologias quânticas no País, com o físico Rodrigo Capaz, é iniciativa da Revista Problemas Brasileiros e do Canal UM BRASIL — realizações da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
Ciência no Brasil, hoje
A ciência brasileira tem passado por dificuldades estruturais nos últimos dez anos. A situação das bolsas de pesquisa muitas vezes desestimula jovens pesquisadores. Isso afeta a formação de profissionais, a produção científica e o desenvolvimento de projetos no País.
“Sempre que há restrições orçamentárias, que ocorreram nos últimos 10 anos, a gente sofre também”, afirma, referindo-se aos pesquisadores. “Durante os anos de mestrado e doutorado, o estudante tem uma bolsa de pesquisa, que é bastante defasada em relação a salários que o mercado poderia oferecer. Se o cientista fosse pensar só nisso, certamente não iria escolher a carreira”, reflete Capaz.
Para ele, a falta de investimentos gera não só perda para o desenvolvimento econômico e de diversos outros setores no País, mas também provoca uma “perda de cérebros” para outros países.
Impactos da nanotecnologia
O desenvolvimento da nanotecnologia tem grandes impactos em áreas estratégicas da sociedade.
Na saúde, segundo Capaz, essa ciência tem produzido sensores para detecção de vírus em seres humanos, o que contribui para o diagnóstico de doenças, entre elas, a Covid.
A área de segurança digital é outra que sofre grande impacto das tecnologias quânticas – que estão relacionadas ao mundo da nanotecnologia.
“Estamos prestes a viver a segunda onda de tecnologias quânticas. Várias nações do mundo estão dedicando recursos para essa tecnologia. As áreas da criptografia e da segurança são as mais afetadas. Grandes empresas internacionais estão avançando rapidamente na computação quântica”, explica Capaz.
Outra área impactada é a de semicondutores, que são matéria-prima para a produção de chips usados nos mais diversos aparelhos eletrônicos.
“Durante a pandemia, houve escassez de semicondutores no mercado e isso prejudicou diversos setores. As pessoas se deram conta que essa fabricação de está muito concentrada em poucos países. Principalmente na Ásia”, explica Capaz.
Com esta constatação, países ao redor do mundo têm adotado como política estratégica a internalização da produção de semicondutores. E, de acordo com o físico, o Brasil voltou a ser um “player” nessa área que envolve fábricas de semicondutores, pesquisa nas universidades e a micronanofabricação de semicondutores.
“É onde o CNPEM quer dar uma contribuição pro cenário brasileiro”, complementa.
Um olhar para o futuro
Com expectativas otimistas em relação ao futuro, Capaz avalia que o desenvolvimento do País nos próximos anos passa pelo investimento em nanotecnologias e em ferramentas de tecnologia quântica.
“O CNPEM, por ter a característica de ser um laboratório nacional, diferente de uma universidade ou uma empresa, tenta apoiar startups para que elas cheguem até o setor produtivo”, explica.
Entre as iniciativas do Centro, Capaz cita o Programa de Aceleração de Deeptechs, cujo objetivo é aquecer e apoiar as DeepTechs brasileiras, startups de base científica e tecnológica, que buscam soluções inovadoras para a saúde, indústria, meio ambiente, entre outras áreas estratégicas para qualquer país.
“Muitas vezes essas empresas precisam usar um equipamento e não têm recursos para pagar. Elas vêm aqui e a gente dá esse suporte de forma gratuita”, explica. “O País, de fato, produz muita ciência, mas pouca inovação. Iniciativas como essa são importantes para tentar melhorar isso.”
Ainda sobre o futuro, Capaz afirma que, em cinco anos, gostaria que o Brasil estivesse mais próximo de países que investem nestas ciências de ponta.
Para ele, uma das áreas de atenção no campo na nanotecnologia nos próximos anos deve ser a de energias sustentáveis.
“Você consegue fabricar hidrogênio de uma forma renovável, o hidrogênio verde. Na área de materiais renováveis, você consegue produzir materiais menos agressivos pro meio ambiente”, completa.