O Brasil necessita de uma revolução produtiva na economia e de uma transformação radical no sistema de ensino, opina Roberto Mangabeira Unger, professor em Harvard e ex-ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República do Brasil.
Segundo o professor, o País deve mudar o seu papel no mercado mundial e pôr um fim no que ele define como uma troca de “natureza bruta por inteligência”. “Mandamos soja pouco transformada para a China, e esses mesmos navios trazem de volta produtos da inteligência humana”, argumenta.
Em entrevista ao Canal UM BRASIL — uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) —, Mangabeira ainda aponta a necessidade de uma aliança entre tecnologia, meio ambiente e a realidade da segurança pública no País.
Revolução produtiva
- A posição do Brasil no mundo. Durante o mês de outubro, as exportações brasileiras de produtos agropecuários somaram US$ 14,27 bilhões, de acordo com o Ministério da Agricultura. O valor é 6,2% superior ao obtido em outubro do ano passado. O setor representou 48,4% dos embarques totais do País no último mês.
- Mercado chinês. Um dos maiores destinos dessas exportações é a China. E, em meio ao G20 — encontro de líderes das maiores economias mundiais, que aconteceu no Brasil na última semana —, o País firmou acordos com a nação asiática, que deverão ampliar as exportações agrícolas, com um potencial comercial de cerca de US$ 450 milhões por ano.
- Mudança de papel. Mangabeira destaca que o Brasil deve passar por uma revolução produtiva para que possa exercer um papel no mercado mundial que vá além da exportação agrícola. “Os mesmos navios em que embarcamos o minério de ferro e a soja trazem de volta produtos da inteligência humana”, explica.
- Transformações radicais. De acordo com o professor, é urgente interromper esse ciclo baseado na troca da “natureza bruta por inteligência”. “E isso exige uma revolução produtiva, ou produtivista, de um lado; e uma transformação radical da Educação, do ensino brasileiro, de outro”, ressalta.
Inteligência e natureza
- Clima e tecnologia. Na COP29, que aconteceu entre os dias 11 e 22 novembro de 2024, no Azerbaijão, as tecnologias digitais assumiram o centro da ação climática global. A Ação Digital Verde, um dos acordos firmados por governos, empresas e organizações presentes no evento, traz diretrizes para acelerar a ação climática e estimular a agenda de desenvolvimento sustentável por meio de tecnologias e inteligência.
- Riqueza “fácil”. Mangabeira pontua que o Brasil, até agora, tem escapado dos grandes debates mundiais que envolvem a aliança entre meio ambiente e ferramentas tecnológicas. Enquanto isso, investe nas “riquezas fáceis” da natureza, como agricultura, pecuária e mineração.
- Riqueza “difícil”. O professor avalia que o País deve se esforçar para desenvolver “riquezas difíceis”, relacionadas à inteligência e à tecnologia, aliadas aos recursos naturais. “Para que o Brasil se soerguesse, teríamos que substituir o modelo de desenvolvimento baseado no divórcio entre a inteligência e a natureza por outro, fundamentado no casamento entre a natureza e a inteligência”, defende.
Crime organizado
- Impactos econômicos. No Brasil, o crime organizado infiltra-se em grandes setores da economia, como mineração, mercado imobiliário, comércio de combustíveis e transporte público — o que, cada vez mais, afeta o crescimento econômico brasileiro.
- Raio-X. Segundo estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com a Esfera Brasil, 72 facções criminosas estão presentes no País, incluindo duas transnacionais. E estas podem faturar cerca de R$ 335 bilhões apenas com o fluxo ilegal de algumas drogas.
- Omissão do Estado. Para Mangabeira, temos, hoje, um “Estado paralelo” em operação no País. Esse setor cresce ao oferecer à população direitos que deveriam ser providos pelo Poder Público. “O crime organizado é um fenômeno da omissão ou da fraqueza do Estado. Ele prospera e desenvolve-se ao assumir e desenvolver funções do Estado”, destaca.
- Insegurança custa caro. Nesse cenário generalizado, o Brasil destina, em média, 6% do Produto Interno Bruto (PIB) — R$ 200 bilhões —, anualmente, para a proteção contra a violência urbana, indicam dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Em meio a câmeras de segurança, seguros, escolta armada e carros blindados, as empresas paulistas gastam quase R$ 60 bilhões por ano com segurança direta, projeta o economista Fabio Pina, da FecomercioSP.