Brasil e mundo vivem uma nova era geopolítica e tecnológica
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EM POUCAS PALAVRAS...
O que você vai encontrar nesta entrevista?
- O Estado não consegue reagir na mesma velocidade dos recentes avanços tecnológicos, avalia Carlos Melo, professor e cientista político.
- Hoje, alguns setores políticos difundem a ideia de um passado idealizado, em que tudo era bom, reflete Melo.
- Ele defende que a eclosão das economias do Oriente inaugurou uma nova era da geopolítica mundial.
Cada vez mais as transformações e os avanços tecnológicos têm ocorrido em um curto período — e o Estado não reage na mesma velocidade, avalia Carlos Melo, professor e cientista político.
“Transitamos do rádio e da televisão para a Inteligência Artificial num período muito curto. A transformação foi muito rápida. Os nossos pais tinham um ritmo de transformação lento. O dos nossos filhos e netos é uma coisa vertiginosa. É uma revolução”, reflete Melo.
Em entrevista ao Canal UM BRASIL — uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) —, o professor comenta novas tendências geopolíticas que afetam o Brasil e o mundo.
Estado e tecnologia
- Fenômeno já aconteceu antes. Melo lembra como as transformações tecnológicas da Primeira e da Segunda Revoluções Industriais foram um choque na vida das pessoas que compunham as sociedades entre os séculos 18 e 20. Hoje, vivemos um momento similar com o advento das tecnologias de ponta e da Inteligência Artificial (IA).
- Transformações no mercado de trabalho. “Pessoas que trabalhavam na sociedade industrial, ou que trabalhavam no campo, nas outras revoluções, ficam desempregadas. Essas pessoas ficam ‘sem trabalho’, o que é pior do que ficar desempregado. Perde-se o paradigma”, explica.
- Política não dá respostas rápidas. Melo avalia que os setores políticos levam tempo para perceber e reagir a esses grandes avanços e essas transformações. “O diagnóstico não é simples nem imediato. Surge um ressentimento até que o Estado possa agir no sentido de reduzir os efeitos dessas transformações”, conclui.
Políticos vendem uma ‘retrotopia’
- Passado idealizado. O professor acredita que, hoje, diversos setores políticos difundem a ideia de um passado em que tudo era bom. “Zygmunt Bauman falava de um processo chamado retrotopia. Isto é, a utopia, ao invés de estar lá na frente, no futuro, está lá atrás, na volta ao passado”, explica Melo.
- Conceito virou slogan. É assim que, de acordo com o cientista político, se materializam movimentos políticos saudosistas que pregam a retomada do passado. Nos Estados Unidos, esse discurso ganhou voz com o slogan “Make America Great Again”, encabeçado pelo presidente Donald Trump. “É uma tentativa — impossível — de voltar para o passado. Aqui, no Brasil, também houve esse discurso de volta ao passado, à esquerda e à direita”, conclui.
Novas tendências globais
- Guerra tarifária. Desde que Trump anunciou novas tarifas de importação de produtos de mais de 180 países e regiões, a guerra comercial e tarifária entre China e Estados Unidos vem ganhando grandes proporções. Para Melo, o fechamento da economia da potência norte-americana e o aumento das tarifas é um movimento protecionista “absolutamente defensivo”.
- Nova era “pós-Ocidente”. O cientista político ressalta que esse protecionismo não se reflete apenas na economia, mas também nos valores. “É o medo. O mundo se reconfigurou. O embaixador Rubens Barbosa disse que talvez estejamos vivendo um momento de ‘pós-Ocidente’”, conta. Com a eclosão das economias orientais, essa região pode assumir uma importância mundial nunca antes alcançada.
- Ascensão de autocracias. Melo ainda enxerga outro movimento global: governos autocráticos, como os casos da Hungria e da Venezuela, ascendem com a proposta de uma democracia “iliberal”. Nesses casos, o autocrata se sobrepõe ao sistema de freios e contrapesos da democracia liberal. “Fecha o Congresso, controla o Judiciário e emerge dali o grupo que vai tomar as decisões que acham corretas”, completa.
- Consequências. O professor acredita que uma parte da população quer, de alguma forma, um autocrata que tome decisões rapidamente — mas esse tipo de governo pode levar a um retrocesso. “Esse movimento é muito perigoso, porque quanto menos discussão, maior é o risco de errarmos e precisarmos fazer tudo de novo”, conclui. Para Melo, seria como retroceder ao início do século.
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