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Política

ago 10, 2018

Tensão política cresce há mais de dez anos, mas não contribui para renovação

Mensalão (2005). Jornadas de Junho (2013). Lava Jato (2014). Impeachment de Dilma Rousseff (2015). O primeiro presidente denunciado por corrupção durante o mandato, Michel Temer (2017). O primeiro ex-presidente preso por corrupção, Luís Inácio Lula da Silva (2018). É verdade que a democracia brasileira nunca navegou em águas calmas, mas a última década implodiu a representatividade dos políticos para a população, cristalizando a desconfiança histórica com a classe. O resultado foi a polarização de ideologias e a indefinição do cenário eleitoral de 2018, no qual apenas uma coisa parece certa: não haverá a ascensão de uma liderança que fuja aos moldes da política tradicional.

“Nosso clima político tem estado tenso há muitos anos. É claro que quando entra o assunto sobre corrupção, piora muito mais, azeda de vez. Desde 2005, com o Mensalão, esse assunto tem estado em pauta continuamente. É muito ruim para a democracia, muito perigoso”, alerta o cientista político Bolívar Lamounier. “O cidadão abre o jornal e diz: ‘Então toda a política é corrupção, não serve para outra coisa a além da corrupção’. É claro que isso é um julgamento errado, mas, à medida que esta situação se perpetua, é isso que as pessoas pensam.”

O advogado constitucionalista Marcus Vinícius Furtado, ex-presidente do Conselho Federal da OAB, ressalta que essa rejeição aprofunda cada vez mais a crise política. “Não podemos generalizar nem criminalizar a atividade pública no Brasil. Nós temos é de participar cada vez mais da política, porque, senão, ela nunca será um espaço em que os cidadãos se sentirão representados”, diz.

Essa presença contínua do cidadão na vida política, porém, não é comum nem mesmo entre aqueles que são filiados às legendas, como afirma a historiadora Maria Aparecida de Aquino. “Muitas vezes, uma pessoa vai à urna estabelecer, colocar e exigir o seu direito de voto, mas acha que sua participação acabou ali”, afirma. “Os partidos ficam ocos. Às vezes, eles têm um número de filiados enorme, mas, na realidade, não temos essa questão da participação [do eleitor] na vida ativa dos partidos”.

Custo de campanhas favorece hegemonia dos grandes

Com o fim do financiamento empresarial, o custeio das campanhas partidárias passou a ser feito exclusivamente com doações de pessoas físicas, que já eram permitidas, e do fundo eleitoral, criado após a Reforma Política de 2017.

O fundo eleitoral conta com R$ 1,7 bilhão de dinheiro público, distribuído entre os partidos de acordo com o número de representantes no Congresso Nacional – recebe mais quem tem as maiores bancadas. Assim, nas eleições de 2018, o MDB será o partido mais beneficiado pelo fundo, seguido pelo PT e o PSDB. Legendas que não têm parlamentares terão acesso a uma pequena parcela: 2% do fundo, dividido entre os 35 partidos existentes.

Além disso, candidatos poderão se autofinanciar até o limite de custo total das campanhas, que também foi estabelecido pela reforma: R$ 70 milhões para presidente, R$ 21 milhões para governador, R$ 5,6 milhões para senador, R$ 2,5 milhões para deputado federal e R$ 1 milhão para deputado estadual.

A reforma estabeleceu ainda a chamada “cláusula de acesso”, segundo a qual os partidos só terão direito ao Fundo Partidário – que continua a existir separadamente do fundo eleitoral – e ao tempo na televisão nos próximos anos se conseguirem eleger, nas eleições de 2018, ao menos nove deputados, em nove Estados diferentes, ou ter 1,5% dos votos da Câmara dos Deputados, com no mínimo 1% dos votos em nove Estados.

“É impossível [surgir] uma nova liderança que não tenha dinheiro. Você não consegue romper o custo de uma campanha política. Isso é injusto. Volta o voto censitário – no Brasil só votava quem tinha dinheiro e poder econômico”, afirma o jurista Flávio Gomes.

A ideia de imobilidade também está na análise do professor de Roberto Romano, professor de Ética e Política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Nossos partidos políticos não são democráticos, são oligarquizados, propriedades de um grupo, às vezes até de um indivíduo”, destaca.

Com as redes sociais no centro das estratégias eleitorais, Flávio Gomes acredita que o ambiente digital é o único para transformar a política brasileira. “Não vejo outra saída além de trazer para o Brasil o que hoje na Europa, sobretudo do Norte, já se começa com grande vigor: uma democracia direta digital”, diz. Na visão do jurista, esse novo poder seria criado por meio de lei e formado por especialistas não remunerados e sem filiação partidária, que dedicariam algumas horas a estabelecer um diálogo entre a classe política e a sociedade civil, fiscalizando a atividade pública.

Para o historiador e cientista político Boris Fausto, porém, o caminho da transformação não é tão claro. “É difícil encontrar formas, a não ser as que sejam [estas]: enfatizar mais a participação de movimentos sociais; tentar integrar diferentes organismos que venham de baixo para cima; e não criar mais instância e organizações que são falsas representações, mas, na verdade, são instrumentos de mando, alguma coisa que vem de cima para baixo. Essas são as indicações. Agora, como fazer isso é um problema em todo o mundo. Nós estamos, de fato, em um momento de crise partidária e crise da democracia, que se juntam à especificidade nossa. O que não podemos é recuar, temos que avançar.”

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