Pequenas empresas estão comandando inovações em todo o mundo
ENTREVISTADOS
As grandes empresas não têm incentivo para fazer algo diferente. Isso só acontece sob forte pressão. É o que defende Nicholas Vonortas, professor de Economia e Assuntos Internacionais na Universidade George Washington.
Ele acredita que é por essa razão que os governos, há algumas décadas, “tentam abrir as fronteiras para criar pressão para que as grandes empresas inovem”.
“É o contrário com as pequenas empresas”, afirma. Para o especialista, a inovação no mundo — fenômeno que ele classifica como socioeconômico e tecnológico — virá dos micro e pequenos empresários, que já estão comandando inovações em todo o mundo, apesar de dificuldades relacionadas à disponibilidade de recursos.
“Você pode ter a melhor tecnologia do mundo, mas se não estiver no contexto certo, se não tiver acesso a financiamento, serviços complementares e equipamentos necessários, a tecnologia falhará”, opina.
Em entrevista ao Canal UM BRASIL — uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) —, Vonortas avalia as indústrias brasileira e chinesa e o futuro das novas tecnologias.
A conversa, que faz parte da série especial de debates promovida pelo Canal em Washington D.C., conta com o apoio da Escola de Governo da Organização dos Estados Americanos (OEA).
O Brasil e as indústrias nacionais
Protecionismo. Vonortas lembra que, apesar da grande abertura comercial dos produtos agrícolas brasileiros, responsáveis por grande parte das exportações do País, a maioria da Indústria nacional segue “protegida”. “Isso não as ajuda, porque vivem em um ‘casulo’ confortável. E quando enfrentarem a concorrência estrangeira, desmoronarão”, conclui. Mas há exceções, pontua. Empresas como Natura e Embraer, na opinião do especialista, têm se mostrado bem-sucedidas na busca pela internacionalização.
Dependência. De acordo com Vonortas, a excessiva proteção do Brasil à sua Indústria criou uma dinâmica interna na qual os governos são capturados. “Estamos lutando contra o mesmo problema aqui [nos Estados Unidos] com cinco grandes empresas. Quando há negócios tão importantes que não há a opção de deixá-los fracassar, nós nos tornamos prisioneiros dessas empresas”, ressalta.
Consequências. O especialista ainda observa que uma consequência desse protecionismo é a alta no preço dos produtos brasileiros. “Os carros estão mais caros. Os bens de consumo estão mais caros. E isso não é real, na verdade. É porque as indústrias locais estão protegidas”, explica.
Questão chinesa
Desequilíbrios. “O consumo doméstico da China é ridiculamente lento. É muito mais baixo do que tudo o que conhecemos. E a parcela de investimento do PIB é tremendamente alta. Então, o que está acontecendo lá?”, questiona. Ele destaca que os recursos estão sendo transferidos do consumidor para o produtor — seguindo o modelo anterior que os trouxe para esse estágio de desenvolvimento.
Fatores. O especialista elenca razões para essa situação, como uma taxa de câmbio que não é a real; taxas de juros que não favorecem os poupadores, mas os tomadores de empréstimo; e uma política forte de subsídios. “Levam-se recursos continuamente para a Indústria”, resume. “Agora que o mercado imobiliário não parece muito bom, por exemplo, os recursos são direcionados cada vez mais para a manufatura”, conclui.
Exportações. Segundo Vonortas, a população não tem capacidade de consumir toda a produção do país asiático, que precisa ser enviada ao exterior. Caso contrário, a economia chinesa sucumbiria. “Se a China fosse menor, isso não importaria muito. Mas estamos falando de uma economia enorme”, explica. “Os Estados Unidos e a Europa foram os absorvedores primários da produção da China. Por um tempo, o governo norte-americano escolheu fazer vista grossa e manteve as coisas funcionando, porque também há benefícios para os consumidores aqui, como produtos baratos”, relembra.
Ameaças. Contudo, agora, essa situação se tornou uma questão política, avalia. Com Donald Trump, as ameaças tarifárias retomaram o centro do debate. E será um problema para a China se os Estados Unidos e a Europa darem um basta nesse modus operandi, avalia Vonortas. “Eles terão de empurrar esses produtos para o Brasil, para a Indonésia e para os outros. Alguém precisa comprar esses produtos. As contas globais precisam fechar”, completa.
O futuro das inovações tecnológicas
Euforia. “Os economistas que lidam com avanço tecnológico sabem que quando uma tecnologia surge — e parece ser realmente radical —, as pessoas começam a pensar que isso vai mudar o mundo”, opina Vonortas. Segundo o especialista, quando esse ciclo de euforia se inicia, há um “superinvestimento intenso”.
Novas tecnologias. Para o professor, é essa a sensação do impacto causado pelo advento da inteligência artificial (IA). “A ferramenta realmente vai mudar muita coisa, inclusive todas as indústrias civis e, também, as militares. A guerra será muito afetada por isso”, opina. Mas é preciso conter a euforia e fazer correções.
Mudanças de rota. Vonortas avalia que o mundo caminha rapidamente para o desenvolvimento da IA, mas é preciso atenção. Além disso, por vezes será necessário recalcular os rumos — processo natural em momentos de grandes avanços tecnológicos. “O sistema legal e o sistema de apoio em geral não estão conosco. E haverá uma grande correção, porque, no futuro, perceberemos os erros cometidos que precisarão ser corrigidos”, completa.
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