Orçamento impositivo mudou a dinâmica política no Brasil
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- Em entrevista ao Canal UM BRASIL, Graziella Testa, cientista política e professora na Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), critica a dinâmica do orçamento impositivo e as disputas eleitorais em torno do tema das emendas parlamentares.
- Para a especialista, a ideia de que o parlamentar deve levar recursos apenas para a própria região está muito arraigada na cultura política brasileira — e é absolutamente insustentável.
- Segundo Graziella, hoje, o Brasil vive um “presidencialismo de coalizão” dominado por “instituições informais”, ou seja, um conjunto de regras que não estão formalizadas, mas que o corpo político obedece.
Em 2015, a Emenda Constitucional (EC) 86 estabeleceu a execução obrigatória das emendas parlamentares individuais. Assim, começava a valer o chamado orçamento impositivo — mecanismo que tem sido alvo de críticas pelas faltas de transparência e rastreabilidade.
O argumento é que, por serem individuais, as emendas favorecem o uso eleitoral dos recursos públicos na relação entre deputados e prefeituras. “A competição eleitoral não pode acontecer por meio da execução dessas emendas”, defende Graziella Testa, cientista política e professora na Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP).
De acordo com a especialista, o orçamento impositivo mudou a dinâmica política no Brasil. Além disso, Graziella defende que, para evitar o uso eleitoral das emendas, a única solução é torná-las coletivas.
Em entrevista ao Canal UM BRASIL — uma realização da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) —, a professora ainda debate os limites do uso desses recursos e o modelo de “presidencialismo de coalizão” brasileiro.
Desafios do orçamento impositivo
- Histórico. Depois de aprovar o orçamento impositivo, que tornou obrigatória a execução de emendas individuais, o Congresso ampliou o mecanismo com a aprovação, em 2019, da EC 100, que tornou obrigatórias também as emendas de bancadas estaduais. Agora, o tema volta ao debate público.
- STF. No próximo dia 27 de fevereiro, membros dos Executivo, Legislativo e Judiciário devem se reunir no Supremo Tribunal Federal (STF) para costurar um acordo sobre a transparência e a rastreabilidade na execução de emendas.
- Críticas. A cientista política explica que, por serem individuais, essas emendas favorecem o uso eleitoral dos recursos públicos. Além disso, o Executivo perde a prerrogativa de escolher quais são aquelas a serem executadas, argumenta Graziella.
Uso eleitoral das emendas
- Troca de favores. Recentemente, um levantamento do jornal Folha de S.Paulo revelou que 110 deputados e senadores concentraram verbas de emendas enviadas a cidades de prefeitos aliados reeleitos em 2024. Foram analisados parlamentares que destinaram 70% ou mais das emendas individuais para essas cidades nos últimos dois anos.
- Insustentável. “A questão toda é: existe uma disputa, inclusive eleitoral, em torno de recursos que torna todo valor insuficiente”, argumenta Graziella. “Essa ideia de que o parlamentar vai a Brasília para levar recursos para a sua região é algo que está muito arraigado na nossa cultura política — e que é absolutamente insustentável”, completa. Para ela, é preciso entender que é papel do Executivo “olhar o Brasil de cima” e quais são as necessidades de cada região — e não apenas da própria.
- Solução. Para evitar que isso aconteça, Graziella acredita que a saída é tornar as emendas coletivas.“Por mais que os deputados sejam competidores, adversários diretos no nível local, eles vão precisar executar em conjunto essa emenda”, ressalta a cientista política. “Estamos pensando do ponto de vista da boa alocação de recursos”, completa.
Presidencialismo de coalizão
- ‘Jeitinho’ brasileiro. A professora também avalia que, no Brasil, convencionou-se criar um modelo de “presidencialismo de coalizão” — referindo-se à prática de alianças e acordos entre Executivo e Legislativo que ditam os rumos das decisões políticas. “Importamos o sistema presidencialista dos Estados Unidos, mas com uma cara parlamentarista, por causa do multipartidarismo e da coalizão”, explica.
- Informalidade. Nesse sistema, existem instituições formais e informais. Neste último caso, apesar de não estarem expressas na Constituição, são muito obedecidas por todos os atores políticos envolvidos. “Trata-se de regras não escritas, mas que todo mundo obedece. Quando começo a estudar o Congresso Nacional, vejo que muitas coisas são repetidas, as pessoas falam sobre coisas como se estas fossem realmente escritas, mas não são”, completa.
- Acordos. De acordo com Graziella, o fato de o presidente da República “escolher formar governo” é uma das regras informais mais fundamentais do presidencialismo de coalizão — apesar de não ser descrita ou regulamentada em lugar algum do texto constitucional.
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