De nação exportadora, a China está mudando o direcionamento de sua economia para o consumo interno. Paralelamente, o gigante asiático planeja ampliar a sua projeção global, o que envolve a implantação de instituições multilaterais sob a sua influência, a diversificação de fornecedores e, em um futuro não tão distante, a anexação de Taiwan. Este é um cenário visualizado por Roberto Dumas, professor de Economia Internacional do Insper e um dos maiores especialistas em China.
Em entrevista ao UM BRASIL, uma realização da FecomercioSP, Dumas destaca que as atuais sanções impostas à Rússia, em volume recorde, em razão da invasão à Ucrânia, já provocam efeitos negativos na economia mundial. Contudo, o mesmo aplicado a Pequim, em uma eventual anexação de Taiwan, seria catastrófico para todo o planeta.
“A China não é um ‘país’. A China faz parte de uma bruta cadeia de suprimento”, pontua. “Se o país sofrer as sanções que a Rússia está sofrendo, seria uma hecatombe na economia mundial”, acrescenta o professor.
Mestre em Economia Chinesa pela Universidade Fudan, em Xangai, e autor de diversos livros sobre o país asiático, Dumas salienta que o mundo não pode se surpreender caso a China decida tomar para si o controle de Taiwan.
“Xi Jinping [atual presidente chinês] está falando. Pode ser que ele mude de ideia com estas sanções [à Rússia], mas é bom todas as empresas brasileiras já levarem em consideração como estratégia”, sugere.
Dumas diz isso porque a China é o maior parceiro comercial do Brasil. Deste modo, eventuais bloqueios a Pequim, nos moldes impostos a Moscou, poderiam travar o comércio exterior brasileiro. Além disso, o professor sinaliza que o governo chinês já tem adotado um projeto de diversificação de vendedores e compradores.
“Eles [a China] não vão substituir [o Brasil], mas já estão desenvolvendo novos fornecedores na Rússia e na África”, alerta. “Não posso ficar dependendo só da China para vender o meu agronegócio. Cadê o acordo de livre-comércio com a União Europeia? Com os Estados Unidos? Vamos ter ou vamos ficar só com o Egito e a Palestina?”, questiona.
Além disso, o especialista – que, inclusive, atuou no Novo Banco de Desenvolvimento (também chamado de “Banco dos Brics”) – aponta que o gigante asiático, ao ter seu espaço restringido nas instituições multilaterais tradicionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, tem liderado a criação de novas organizações e blocos econômicos.
Ademais, destaca que, atualmente, a política econômica não se trata mais de crescer a taxas exponenciais, mas de rever a composição do Produto Interno Bruto (PIB), elevando a participação do consumo das famílias como forma de legitimar o poder do Partido Comunista com a população.
Como comparação, enquanto o consumo representa 64% do PIB brasileiro e quase 70% do norte-americano, ainda gira em torno de apenas 38% da economia chinesa.
“Economia, política e sociedade são uma coisa só. Se a economia vai mal, se não consegue crescer, a sociedade reclama, pede a ‘cabeça do rei’, não vota ou não reelege. Na China, não pode ter isso”, explica. “O que o governo chinês quer fazer? Quer diminuir um pouco o PIB, crescer menos, mas o consumo subir mais”, complementa.
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