Desigualdade no Brasil é cultural e pode ser “desinventada”
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- De acordo com o antropólogo Michel Alcoforado, a desigualdade no Brasil é cultural. "Ela foi construída a partir de um determinado arranjo histórico, que nos colocou aqui. Mas tudo que a gente inventa, a gente pode ‘desinventar’", diz.
- Especialista em traduzir movimentos culturais em estratégias para negócios, Alcoforado lembra que a cultura não pode ser ignorada pelas marcas e mercados.
- O especialista lembra que negócios que adotam fórmulas que vêm de fora nem sempre alcançam o sucesso esperado. “A quantidade de fórmulas que a gente importou dos Estados Unidos e da Europa, que quando chegam aqui não funcionam, é enorme”, ressalta.
“A desigualdade no Brasil é cultural. Ela foi construída a partir de um determinado arranjo histórico, que nos colocou aqui. Mas tudo que a gente inventa, a gente pode ‘desinventar’”, é o que defende o antropólogo Michel Alcoforado.
O antropólogo acredita que, se nós mesmos criamos esse modelo de sociedade, também podemos alterá-lo. O desafio é enfrentar justamente o caráter cultural da injustiça social.
“A elite brasileira é sensível à desigualdade, comove-se. Há uma série de estudos de sociólogos ao longo do tempo que mostram isso. Agora, o problema é que ela, em geral, acha que essa é uma questão mais do Estado do que da sociedade”, diz.
Em sua opinião, é esse pensamento que faz com que, mesmo diante do tamanho do problema, a taxa de engajamento na solução se mantenha baixa — apesar de avanços recentes no combate às disparidades sociais no País.
Em entrevista à Revista Problemas Brasileiros e ao Canal UM BRASIL — ambas realizações da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) — o sócio-fundador da consultoria Consumoteca também reflete sobre a influência da cultura nas marcas, nos negócios e na sociedade no século 21.
Não existe produto sem cultura
- Papel estratégico. Especialista em traduzir movimentos culturais em estratégias para negócios, Alcoforado lembra que a cultura não pode ser ignorada pelas marcas e mercados. “Toda vez que a gente não leva em consideração a cultura, ela come a nossa estratégia no café da manhã”, ironiza. “Não dá para inventar um produto que seja vencedor sem levar em consideração a cultura”.
- Autenticidade é diferencial. Alcoforado explica que a bagagem cultural é indispensável para que um empresário tenha sucesso. “Em um mundo com oito bilhões de pessoas, e com uma ameaça cada vez maior sobre a possibilidade de empregos, dado o avanço da tecnologia, a única coisa que teremos de oferecer de diferente é a nossa autenticidade”, observa.
- Caminho para a inovação. A autenticidade, segundo o antropólogo, é a capacidade de mesclar experiências de vida, vivências, cursos, viagens, influências, tudo que foi acumulado ao longo da vida. “Isso possibilita dar novas respostas, e mostrar para os outros que você é único e tem algo a oferecer para o mundo”, completa.
O problema de importar modelos
- Mais do mesmo. O especialista lembra que negócios que adotam fórmulas que vêm de fora nem sempre alcançam o sucesso esperado. “A quantidade de fórmulas que a gente importou dos Estados Unidos e da Europa, os modelos de negócios ensinados nas universidades norte-americanas, em todos esses MBAs, que quando chegam aqui não funcionam, é enorme”, ressalta.
- “É só olhar a 25 de Março”. “Um autor norte-americano dizia que a entrada da loja era a ‘zona de descompressão’. E todo varejista devia deixar poucos produtos importantes ali, porque o consumidor, quando entra, ainda está ‘entendendo o que é a loja’. Esse modelo não cabe no Brasil”, explica Alcoforado. “É o contrário. Vai no Brás, na 25 de Março. Não apenas o core está na ponta da loja, como tem alguém gritando, do lado de fora: ‘venha pra cá, venha pra cá, venha pra cá’”, pontua.
Diversidade e antropologia
- Ciência do século 21. Alcoforado acredita que a sociedade, atualmente, está se dando conta de que vivemos em um mundo culturalmente diverso. Segundo ele, é a antropologia, considerada a ciência destes tempos, que pode nos ajudar a viver em harmonia. “A única possibilidade de conviver num modelo de sociedade em que você entende que cada um é de um jeito, é entendendo que há outras possibilidades de ser”, enfatiza.
- Menos bolhas, mais diálogo. O especialista opina que, se a antropologia tivesse força no País, a sociedade compreenderia as escolhas do outro, as razões para cada tomada de decisão e seria, assim, mais aberta ao diálogo. “Menos grupos de WhatsApp com as famílias brigando por posição política, mais gente entendendo que no dia da eleição cada um tem seu voto”, elenca.
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